domingo, 31 de março de 2013

1001 Filmes: Spoorloos (1988)


Nota: Este post foi instigado pelo livro "1001 Movies You Must See Before You Die".

Um thriller holandês bastante perturbador que nos guia até ao encontro entre Rex Hofman, um homem obcecado pelo desaparecimento da sua namorada durante uma viagem por França anos antes e Raymond Lemorne, o metódico sociopata que planeou o rapto desta. Rex, consumido pela incerteza do destino da rapariga, fará tudo para saber o que se passou e Raymond irá aproveitar-se da obsessão deste para levar mais além a sua perversão.

Com uma direcção precisa, quase clínica, Spoorloos vai-nos desvendando aos poucos a mente e o desenvolver do método de Raymond e talvez seja mesmo por tudo ser mostrado de um modo tão factual que se torna perturbador. Raymond apodera-se de pequenos pormenores quotidianos para aperfeiçoar o seu plano malévolo com a leveza e satisfação de quem colhe ideias para uma receita de culinária.

Por contraponto a Raymond, Rex é o lado emocional deste binómio, quem sente uma vertigem movida pela curiosidade. É ele quem nos puxa para essa vertigem e nos guia até à sua inevitável destruição num final memorável.


sábado, 30 de março de 2013

Ferrugem e Osso (De Rouille et d'Os) (2012)



Um drama de Jacques Audiard com Marion Cottilard no papel de uma treinadora de orcas que se vê amputada de ambas as pernas e Matthias Schoenaerts no papel de um pai solteiro. Ela de espírito quebrado pelo acidente que a mutilou, ele perdido, sem objectivos e muitas vezes insensível. Uma relação algo atípica mas intensa vai-se desenvolvendo entre eles. 

Ambas as personagens são plenas de nuances, os seus protagonistas têm actuações brilhantes e o filme consegue momentos sublimes quando estas duas personagens transcendem as suas limitações físicas e emocionais (a cena do primeiro mergulho, o reencontro com a orca, uma das cenas de sexo, os momentos finais dele ao telefone). No entanto, em parte por causa do acto final, enquanto história de uma relação, Ferrugem e Osso deixou-me a sensação de ter visto dois filmes: um deles sobre a história de uma mulher que precisava de uma relação para reaprender a viver e o outro sobre a história de um homem que precisava de repensar a vida para poder ser parte de uma relação. Ambos os filmes são muito bons mas juntos, não completamente afinados. 

segunda-feira, 25 de março de 2013

Lore (2012)



Lore é uma viagem por um país em negação. Passado na Alemanha imediatamente após o fim da 2ª Grande Guerra e da derrota, o filme segue a viagem de Lore e dos seus 4 irmãos a caminho da casa da avó, após a prisão da mãe e do pai, um oficial da SS.

Será uma dura viagem através de um país dividido, orfão e incrédulo, à beira de uma colossal crise de identidade. E será também uma dura jornada espiritual para a adolescente Lore, também ela orfã e em crise de identidade, meio menina meio mulher (cada vez mais mulher que menina), perdida entre a imagem idealizada da estrutura social alemã e os horrores reais da guerra. Uma jornada que a ela, mais que às outras personagens, vai trazer uma nova consciência, imperativa e sem condescendências. Os irmãos são novos demais e capazes ainda de manter uma dose de inocência e de credulidade; os adultos do filme estão demasiado comprometidos com o que se passou e com a ideologia que interiorizaram para nos primeiros momentos do pós-guerra conseguirem admitir o que se passou. Mas Lore, em pleno tumulto interior, sairá desta viagem marcada e em revolta mas por isso mesmo será também quem ficará mais próximo de uma possível redenção.

Neste filme australiano (mas falado quase inteiramente em alemão), a direcção de Cate Shortland, consegue permear o duro realismo com imagens de grande beleza e atenção aos detalhes, conseguindo juntamente com a performance de Saskia Rosendahl, a jovem e estreante actriz principal, trazer uma dose de poesia a uma história, de outra maneira, depressiva.

sexta-feira, 1 de março de 2013

1001 Filmes: The Sweet Hereafter (1997)

Nota: Este post foi instigado pelo livro "1001 Movies You Must See Before You Die".

Como se sobrevive à morte de um filho? E como sobrevive uma comunidade a uma grande tragédia colectiva? 

Um advogado, ele próprio a braços com a sua dor pela perda das esperanças de felicidade que tinha para a sua filha, acredita que a redenção de uma comunidade rural repentinamente amputada da maioria das suas crianças pode estar na atribuição de culpas e na união através de um processo judicial.

Através dele vamos conhecendo o antes e o depois de uma comunidade tocada pela devastação e desalento e que procura o caminho para a reinvenção e recuperação, mas onde os seus esforços turvados pela sua própria tragédia pessoal podem levar à desagregação total.

Com uma narrativa subtilmente fragmentada e filmado com delicadeza, The Sweet Hereafter é um filme tocante sobre o luto e a necessidade de por vezes se ultrapassar a dor individual para a sobrevivência e união da comunidade.